Pau dos Ferros – Malhada de Areia, 10 de junho de 1849.
Ilmo. Sr. Bento Cavalcanti Albuquerque Maranhão.
Recebi a carta de Vmcê. com data de 9 de marco p. passado a que exigia de mim envidasse o meu pequeno valimento para com meu pai e tios restituirmos “a sua prezada consorte” e acabar de um só golpe tão passados males. Para não passar por incrível, respondo dizendo e certificando-lhe que de uma só vez jamais lhe poderei ser útil na exigência que me fez, por muitos motivos – o primeiro e principal é que minha, prima esta por quem Vmcê. se interessa, diz a peito limpo preferir morrer antes que ter algum dia um só pensamento de viver em sua companhia. E por isso quando muito não quisesse abusar da confiança da minha família para fazer o seu pedido; quando porém quisesse aterrar os direitos da humanidade, resistir a censura pública, jamais poderia sufocar a voz da razão a ser surdo ao brado de minha consciência, que me assusta cada vez mais que por uma tentazia imaginária com esta a esboçar ações indiscretas. E assim não posso ser com Vmcê. sócio em tal pretensão, porque classificou-se Vmcê. na esfera de um monstro, que se alimentando no suco da discórdia, está sempre com espada desembainhada para promover intrigas e dissensões, e, para isto tomou por garbo a perpetrar um ato tão execrando que deve horrorizar a tôda sua posteridade. Admiro-me muito e muito haver homens que sancionem tais casos, porém, estou certo de que êles não estão certificados da ocorrência do fato, porque se o soubessem diriam como eu digo e falariam como eu falo. Ainda que Vmcê. diz ter detestado todas as ações anteriores e dar mostra de compução, por isto, talvez, tenha pretensões a alcançar o que pretende. E eu o apoio e bem sei que é regra geral que arrependidos devem ser absolvidos, porém, é conforme a resolução de não reincidirem no crime, pois, Vmcê. dá aviso de arrependimento, porém, sempre renitente. Cêda à louca pretensão que eu lhe prometo que não sofrerá nenhuma perseguição dos de minha família. Dirá Vmcê. como já o tem feito que é um dever natural do homem amar e morrer por sua esposa. Espôsa...! Não manche com falso título um nome tão sagrado, não acoberte com o cândido veu da inocência tão negro crime, dê-lhe o nome de vítima, inocente e imolada pelo furor assomo brutal que os cruéis falsos protestos soube bem iludir o Ministro de Jesus Cristo, para cometer tão imundo sacrilégio. Sacrilégio incrível de que a mesma natureza infensa se horrorisa e o mesmo Deus cedo ou tarde há-de providenciar com a reta justiça de sua Onipotência. Vivemos hoje sobrecarregados dos imensos laes que nos causou o desgovernado amor da sua alma desenfreada. A minha prima, esta a quem Vmcê. dá o falso título de consorte, vive gemendo os seus males sucumbida no deserto ela tristeza, à maneira da inocente rôla que, sendo agredida pelos aruáis rapinos, veloz por um incidente escapa de suas garras, se entranha na espessura dos bosques, onde cercada de horror, gemendo, vive lastimando a sua sorte. Tal é o seu estado. E por conseguinte, o Senhor se desimagine dessa louca pretensão, que jamais conseguirá o que tão loucamente intenta, pois, poderá haver sacramento onde há sacrilégio?
A minha prima, de maneira alguma aceitará os seus propósitos. E a minha família ainda a esgotar todo os direitos quanto for possível lançar mão e eu, de acôrdo com ela na defesa dos direitos que nos assiste. Dirá Vmcê. que tendo eu cingido o hábito de S. Pedro, sou o primeiro a lhe promover a guerra como inimigo fidagal. Declaro ao senhor que não incôrro no preceito de Jesus Cristo, no seu Santo Evangelho. Sou sempre amante da verdade. E por isso mais uma vez repito: Vmcê. se desimagine dessa louca pretensão que é trabalhar em vão; é malhar em ferro frio; é questionar sem direito; é demandar sem razão. Teria muito que dizer-lhe, ainda, a respeito, porém, julgo inútil porque muito melhor saberá Vmcê. do que.
É o que tenho a dizer, êste que é de Vmcê. um servo, criado e patrício.
Pe. José Paulino do Rêgo Leite.
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